Uma crise econômica ocorre
quando diversos fatores afetam a reprodução material de uma sociedade, impossibilitando-a
de produzir o suficiente para o seu sustento. Antes da formação do capitalismo,
as crises econômicas eram ocasionadas por fatores externos à economia:
climáticos (secas, tempestades), biológicos (epidemias), sociais e políticos
(guerras). Ou a população decrescia,
faltando mão de obra para a produção, ou as plantações eram devastadas, gerando
mortes devido à fome.
Com os avanços na produção
agrícola, na medicina e na ciência no mundo ocidental, muitos desses fatores
deixaram de ter tanto peso na eclosão de uma crise econômica. Desde o século
XVI, com as grandes navegações e o avanço do domínio europeu sobre o resto do
mundo, formou-se uma economia-mundo, pois a produção de riquezas e a reprodução
material de uma sociedade não dependia mais apenas do que ela produzia, mas
também da produção de outras sociedades.
O surgimento do capitalismo
industrial, com a Revolução Industrial inglesa ocorrida no século XVIII,
modificou completamente a constituição da economia. Como vimos no oitavo ano, a
introdução das máquinas no processo produtivo gerou uma nova divisão social do
trabalho, organizada entre os donos dos meios de produção (burguesia, patrões,
empresários) e os vendedores de mão-de-obra (trabalhadores), produzindo uma
concepção de riqueza e de distribuição do que era socialmente produzido. A
posse dos meios de produção e a usurpação do domínio do processo produtivo
(matéria-prima, lugar de produção, técnica, produto final, preço, lucro) dos
trabalhadores deu aos burgueses o poder de ficar com a maior parte dos
rendimentos sobre o que era produzido. O “lucro”, ideia que surge com o
capitalismo, nada mais passou a ser do
que o fruto da exploração da mão-de-obra do trabalhador, tudo porque era o
patrão que detinha a máquina e os trabalhadores não podiam competir com ela.
Porém, com o espetacular aumento
da capacidade produtiva das sociedades, acreditava-se que haveria trabalho e
riqueza para todos. Acreditava-se no poder regulador do “mercado”, leis
naturais que atuavam sobre as relações sociais de produção, satisfazendo a
necessidade de todos. Estas ideias, chamadas de “liberalismo econômico”, foram
introduzidas nos Estados Nacionais do século XIX, servindo de justificativa,
num primeiro momento, para a exploração sem regras dos trabalhadores. Num
segundo momento, algumas empresas ficaram mais poderosas que outras, eliminando
a concorrência. Surgiu o capitalismo monopolista, não mais de pequenas empresas
que competiam “saudavelmente” entre si de acordo com as “leis de mercado”, mas
de grandes empresas que dominavam o Estado e possuíam um grande poder de
investimento, criando novas tecnologias que aumentavam sua capacidade produtiva
e melhorava a vida das sociedades (a eletricidade, a ferrovia, o aço, o
telégrafo, a comida enlatada).
Com o aumento espetacular da capacidade
produtiva, o continente ficou pequeno para as grandes empresas destes
países. Por quê não houve um controle
sobre a produção destes países ao ponto de existir espaço para todos? Porque o capitalismo é por sua natureza
competitiva, portanto, se o rendimento da sua produção não for reinvestido para
que sua produção cresça e você possa vender ainda mais, outra empresa o fará e
te eliminará do mercado. Quando os interesses das grandes empresas passaram
a se identificar com o Estado Nacional, a competição por mercados tomou o
mundo, e transformou-se no imperialismo.
O domínio do capitalismo europeu sobre todos os continentes, impondo sua
cultura em nome de destruição de outras.
A Primeira Grande Guerra foi
produto da competição internacional promovida pelo capitalismo monopolista
através do imperialismo. Como consequência, a Europa, berço do capitalismo até
então, terminou destruída, com um terço de seus homens em idade produtiva,
mortos ou incapacitados para o trabalho. Os EUA, potência americana em
ascensão, foi a grande beneficiária da Grande Guerra. Com o desenvolvimento
espetacular de suas indústrias na segunda metade do século XIX e nas primeiras
décadas do século XX, saiu intacta do conflito mundial e como principal
economia do globo terrestre. A reconstrução da Europa na década de 1920 ocorreu
com muitos capitais estadunidenses. O dólar tornou-se a principal referência
monetária das trocas internacionais.
O lugar de protagonista ocupado
pelos EUA na economia global na década de 1920 e a saturação do capitalismo
liberal (de crença na livre regulação do mercado) foram dois fatores que
explicam a crise mundial de 1929 após o “crash” da Bolsa de Valores de Nova
York ocorrido em setembro de 1929. Mas o que explica o “crash” da Bolsa de Nova
York? Para o entendermos, precisamos compreender para que existe uma Bolsa de
Valores e o significado do “capital financeiro”.
O “capital industrial” está
relacionado a capacidade real de produção de uma empresa. Ou seja, depende
apenas do que é sua estrutura produtiva e da sua capacidade de vender seus
produtos e lucrar. Porém, na fase do “capitalismo monopolista”, as empresas,
para crescer mais e continuarem competindo, dividiram-se em milhares de partes
para serem vendidas e assim, conseguir mais dinheiro para investir mais. Estas
partes, chamadas de “ações”, são lançadas na Bolsa de Valores, onde se compra e
vende essas ações. Comprando “ações”, o investidor passa a ser um tipo de sócio
minoritário da empresa. Quanto mais as empresas lucram, as ações dos acionistas
também lucram, através da movimentação (compra e venda dessas ações). Nos
primórdios do capital monopolista, o capital
bancário (aquele cujo lucro está associado
aos juros cobrados sobre ações financeiras como empréstimos, poupança, seguros,
etc.), associou-se ao capital industrial, investindo na compra de ações das
empresas. Com os altos lucros possíveis nessas ações financeiras, a compra e
venda de ações disseminou-se entre partes significativas das ações.
O lucro do acionista, num
primeiro momento, esteve associado ao lucro real de uma empresa, que aumentava
sua capacidade de investimento e vendia mais e mais. Porém, com o tempo, a
livre compra e venda de ações tornou-se uma espécie de jogo de apostas, no qual
o preço das ações começou a se desligar da economia real, material, aquela
intimamente associada aos lucros reais das empresas. Especulava-se os preços das ações, que subiam e desciam por causa de notícias
falsas plantadas pelos “especuladores”, corretores de ações que viviam de
comissões sobre a compra e venda das ações. O que não quer dizer que, na
realidade, essas ações estavam desvinculadas do desempenho das empresas.
Entre 1923 e 1929, os chamados
“loucos anos 1920”, a economia estadunidense andava de vento em popa, com
níveis excelentes de crescimento e lucro e investimentos de toda a parte do
mundo. Porém, em 1929, a superprodução agrícola e uma diminuição do consumo
diminuiu este ritmo de crescimento. Com a queda da procura, as empresas tiveram
que diminuir sua produção, e em consequência, seus lucros. Suas ações passaram
a valer menos. A realidade alcançou a Bolsa de Valores de Nova York em setembro
de 1929, com a queda conjunta do preço das ações, sem quaisquer compradores. Em
24 de outubro de 1929, conhecido como a “Terça-Feira Negra”, a bolsa sofreu seu
“crash” (quebra). Com ações sem compradores, seus preços caíram
vertiginosamente, perdendo quase que completamente seu valor. Muitas pessoas
que haviam investido tudo o que tinham em ações ficaram pobres da noite para o
dia. Milhares de empresas no mundo todo foram rapidamente à falência, uma vez
que suas empresas não lucravam mais e perderam toda a capacidade de
investimento. Para tentar diminuir os danos, os EUA trouxeram de volta ao seu
país os capitais investidos ao redor do mundo, levando outros países à
falência. Os preços de todos os produtos despencaram no mundo todo. Como
exemplo de casa, o Brasil, cuja economia dependia quase exclusivamente dos
preços internacionais do café, também ingressou numa crise econômica sem
precedentes. Era o efeito dominó de economias que atuavam na crença absoluta
das infalíveis leis do mercado. Um dos únicos países a sair da crise foi a
União Soviética, isolado do mundo capitalista devido a sua revolução comunista,
desenvolvia sua economia a partir da total intervenção estatal na economia. O
liberalismo econômico ocasionou a maior crise econômica que o mundo até então
tinha visto. As soluções, embora fossem
diferentes em sua essência política,
tiveram algo de muito comum: a
intervenção do Estado na economia.
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