“Segundo o historiador inglês Eric J. Hobsbawn, o racismo tinha um papel central em uma ciência social que se desenvolvia rapidamente, a antropologia, fusão de duas disciplinas sensivelmente diferentes, a “antropologia física” (basicamente derivada de interesses anatômicos e similares) e a “etnografia”, ou a descrição de várias comunidades geralmente “atrasadas” ou “primitivas”. Ambas desviaram sua atenção para o problema da diferença entre os diversos grupos humanos e (calcadas no modelo evolucionista) o problema da descendência do homem, assim como os diferentes tipos de sociedade, “dos quais o mundo burguês parecia sem dúvida o mais elevado”. Para os antropólogos do período, a evolução biológica darwniana sugeria uma hierarquia das raças, o que sua disciplina procurava comprovar através de minuciosas medições cranianas (frenologia) e através do método comparativo entre as culturas (antropologia cultural), onde o nome de E. B. Tyler (1832-1917) ganhou destaque. Tyler e outros observavam comunidades e culturas que os levavam a concluir que elas não eram diferentes por natureza, mas representativas de um estágio anterior da evolução no caminho da civilização moderna. Deste modo, termos privilegiados no período, como “civilização e“progresso”, eram entendidos não enquanto conceitos específicos de uma determinada sociedade, mas como modelos universais. Acreditava-se que o conjunto da humanidade passaria pelos mesmos estágios do progresso evolutivo.
O Darwinismo Social, juntamente com a antropologia e a etnografia do século XIX ajudaram a construir a idéia de “missão civilizatória” das potências imperiais. Deste modo, o chamado neo-imperialismo das últimas décadas do século XIX trazia consigo a noção de que havia um “fardo do homem branco” de levar o progresso e a civilização aos povos “primitivos” e “atrasados”.
Os teóricos racistas dos oitocentos também estavam preocupados com o problema da mistura racial. O mestiço era o exemplo da “degeneração”surgida com o cruzamento de “espécies diversas”. Baseado no fortalecimento da tese poligenista, as raças humanas deveriam ver na hibridação um fenômeno a ser evitado. O principal nome nesse sentido foi o do conde de Gobineau (1816-1882), autor do “Ensaio sobre a desigualdade das raças humanas”, publicado em 1854 e de enorme repercussão européia. Este acreditava que a desigualdade das raças humanas não era uma questão absoluta, mas um fenômeno ligado à miscigenação.
Essas idéias baseadas na pureza racial inspiraram o surgimento da eugenia, doutrina fundada pro Francis Galton (1822-1911) e que teve ampla aceitação principalmente na Alemanha. A “ciência eugênica” tinha como pressuposto a idéia de que os caracteres mentais e, sobretudo, a inteligência eram hereditários ao mesmo título que os caracteres físicos. Deste modo, pretendia-se realizar a“higiene racial” através da intervenção na reprodução das populações, com a proibição de casamentos inter-raciais e a incidência de severas restrições sobre alcoólatras, epilépticos e alienados.
A popularidade destas teorias raciais na Europa do século XIX pode ser percebida pelo sucesso dos “zoológicos humanos”, ou seja, das exposições de tipos humanos exóticos. De acordo com Magnolli, um mercado consumidor amplo para a exibição de “raças inferiores” configurou-se a partir da década de 1870, quando cidades como Londres, Paris, Nova York, Amsterdã, Antuérpia, Hamburgo, Milão e Barcelona começaram a receber exposições que atraíam duas a três centenas de milhares de visitantes e ofereciam atrações como pigmeus africanos e neozelandeses, negros da Núbia, apaches, esquimós e nativos de Samoa ou do Suriname.”
(Texto extraído de Flávio Raimundo Giarola, Racismo e teorias raciais no século XIX: Principais noções e balanço historiográfico, disponível em http://www.historiaehistoria.com.br/materia.cfm?tb=alunos&id=313#_ftn1.)
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